quinta-feira, 23 de março de 2023

ÁGUAS DE MARÇO. E DE JANEIRO, FEVEREIRO...

Findo o tenebroso tempo das ruidosas e invasivas motociatas, uma barqueata (e nem é a primeira) desfilou pelas águas da Baía de Guanabara no último domingo. O cortejo marítimo, levando pescadores, ambientalistas, pesquisadores, comunicadores, e acompanhado por uma embarcação da Marinha, sinalizou a abertura da I Conferência Participativa de Restauração da Baía de Guanabara (PRAI-BG, 2023-2030).
Elmo Amador, geógrafo, geólogo e ambientalista, viu nas qualidades da Guanabara também a sua perdição: “A água abrigada, a facilidade de acesso ao interior através de suas águas e rios e as riquezas de suas matas atraíram a cobiça dos europeus que aqui se instalaram e construíram uma cidade colonial, que para se desenvolver soterrou brejos, lagunas, manguezais, restingas e matas, arrasou morros, modificou a geografia e finalmente envenenou as suas águas”. 

 Nem o título de Patrimônio Mundial, concedido pela UNESCO em 2012, salvou a Baía de Guanabara da degradação ambiental. Amador faleceu em 2010 sem ver sua amada baía livre da poluição, apesar do 1,2 bilhão de dólares gastos com o PDBG. O prometido legado das Olímpiadas do Rio, de 2016, também não se concretizou. 

 Em junho de 2022, um estudo do Inea concluiu que os 21 pontos analisados apresentavam resultado ruim ou péssimo. Mudam atores - Cedae, Águas do Rio – mas o problema não só persiste, como cresce. As causas vão desde despejo de esgoto não tratado, de lixo, resíduos industriais até navios sucateados. 

A luta das comunidades que vivem no entorno da Baía de Guanabara é uma das muitas frentes necessárias na “guerra” pelo direito à água limpa. O direito à água e ao saneamento está consagrado numa Resolução da ONU de 2010, mas ainda distante de milhões de pessoas pelo mundo. No século 20, segundo dados da Unesco, o consumo de água no planeta aumentou seis vezes, duas vezes mais do que a população. Contudo, foi o crescimento da atividade industrial e especialmente do agronegócio que engoliu a maior parte deste volume. 

 Segundo levantamento do MapBiomas Água, o Brasil ganhou 1,7 milhão de hectares de superfície de água em 2022, mas os pesquisadores alertam que nos últimos 20 anos observa-se uma retração quase constante neste volume de água. Objeto do desejo de grandes corporações, lobbies poderosos trabalham para a privatização da água. 

 No Dia Mundial da Água há pouco que celebrar e muito a repensar. E agir. A prioridade no acesso à água deve ser para manutenção da vida. É para a vida e não para a morte que a água existe no planeta. Que esta preciosidade chegue a todos, livre de contaminantes, resíduos da mineração e do garimpo, substâncias tóxicas, despejos industriais. 

 Como diz Eduardo Galeano, a utopia pode ser inalcançável, mas nos faz caminhar em sua direção. E o caminho para alcançar esse direito básico à água limpa é pavimentado pelo investimento na educação ambiental, por maior conscientização da população, empenho na fiscalização. E uma redefinição do conceito de desenvolvimento. 


FONTES:

Foto barqueata: https://baiaviva.org.br/

 

AMADOR, Elmo. Sugestões de roteiros a serem percorridos por embarcação na Baía de Guanabara – Projeto Educação Ambiental do PDBG, 2003

 Baía de Guanabara tem toda sua água classificada como péssima ou ruim - Publicado em 28/06/2022 - 17:30 Por Solimar Luz - Repórter da Rádio Nacional - Rio de Janeiro

https://agenciabrasil.ebc.com.br/radioagencia-nacional/meio-ambiente/audio/2022-06/baia-de-guanabara-tem-toda-sua-agua-classificada-como-pessima-ou-ruim?fbclid=IwAR1GSqdBOnMha4FXT5czqr9ii-v8HwaNYVFHJy-wRKReI4Iw2vDsaoggS54

Rio de Janeiro é Patrimônio Mundial - https://news.un.org/pt/story/2012/07/1409211

Brasil ganha 1,7 milhão de hectares de superfície de água em 2022

https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2023-02/brasil-ganha-17-milhao-de-hectares-de-superficie-de-agua-em-2022 

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