terça-feira, 18 de junho de 2013

INCLUSÃO, CONSUMO E CIDADANIA: UNINDO PONTAS SOLTAS (1)



Assumindo que a exclusão não se liga apenas ao fator econômico, ainda que este seja um aspecto fundamental, podemos dizer que não é exclusivamente pelo consumo que se combate a exclusão social. Em vista disso, quando se pensa em igualdade, cidadania, direitos, inclusão, não basta, por exemplo, invocar a ascensão de milhares de brasileiros de uma classe social para outra, como tem sido amplamente noticiado pela mídia e divulgado pelos órgãos governamentais nos últimos anos. As pesquisas indicam que a classe média cresceu e está consumindo mais[1], mas entendemos que não é o suficiente aumentar o poder compra dos indivíduos se nesta cesta de produtos não costumam estar bens culturais diversificados. Incluir não significa apenas dar acesso ao consumo – ainda que este seja também um modo de inclusão, como defende Nestor García Canclini (1997) -, pois este não é suficiente para promover a igualdade social plena. Como observa o sociólogo Octavio Ianni, “a mesma sociedade que fabrica a prosperidade econômica fabrica as desigualdades que constituem a questão social” (Ianni, apud Fernandes, 2010, p.36).


A exclusão persiste se o que se dá a essa nova classe média são produtos de segunda categoria, sejam os bens de consumo, sejam os bens culturais, ou produtos de cultura de massa mascarados de cultura popular. Segundo Stuart Hall, a cultura popular quando é mercantilizada e estereotipada (como acontece com frequência), não constitui “a arena onde descobrimos quem realmente somos, a verdade de nossa experiência. Ela é uma arena profundamente mítica. É um teatro de desejos populares, um teatro de fantasias populares”. (Hall, 2003, p.348). Deste modo, aqueles indivíduos não estarão realmente incluídos se não lhes são conferidas as mesmas oportunidades de escolha e a capacidade de avaliar criticamente o que lhes é oferecido.


Na lógica capitalista, a atribuição de valor aos bens e produtos segue parâmetros arbitrários, altamente variáveis, criando um ambiente de instabilidade e insegurança[2]. O que hoje vale muito, amanhã pode ser inútil. Jürgen Habermas, já na década de 1960, entendia que as leis de mercado se infiltram na substância das obras. Segundo ele, essas leis extrapolam a publicidade, a apresentação da embalagem, de modo que a criação das obras “se orienta, nos setores amplos da cultura de consumo, conforme os pontos de vista da estratégia de vendas no mercado” (Habermas, apud Rüdiger, 2008, p.139). O panorama contemporâneo revela o quanto “o capitalismo rompeu os limites da economia e penetrou no campo da formação da consciência, convertendo os bens culturais em mercadoria” (Rüdiger, 2008, p.139). Exemplos disso são os filmes que ocupam a maioria das salas de cinema, onde prevalece um tipo de produto nitidamente focado no lucro financeiro e preocupado mais com o mercado do que com a arte, a criatividade, a diversidade, a reflexão. São obras que vêm acompanhados por maciça propaganda, tendo seus custos aumentados exponencialmente devido às verbas destinadas à publicidade do próprio filme e de uma série de produtos que vêm na esteira de seu lançamento nas salas de cinema.


          Edgard Morin (2009) também observa uma estreita relação entre a cultura de massa e o capital, já que aquela supervaloriza o consumo ligado às promessas de lazer como fuga do cotidiano, de juventude permanente, de felicidade instantânea. Para Morin, são como mercadorias ou bônus que ganhamos ao comprarmos este ou aquele produto, havendo uma projeção do sujeito em figuras mitológicas: é o homem sobre-humano envolvido pelo sentimento de “olimpianismo”.



[1] Consumo da classe C cresce sete vezes desde 2002. Matéria de 17/12/10, disponível em:

http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2010/12/101217_classec_consumo_jf.shtml - acesso em 17/03/2011. O filme Família Braz – Dois Tempos (Arthur Fontes e Dorrit Harazim) é um retrato desse crescimento e das escolhas que são feitas ao se consumir.




[2] Em 2008, a quebra do banco de investimentos Lehman Brothers desencadeou uma grave crise econômica que teve reflexos em várias economias mundiais. http://noticias.r7.com/economia/noticias/relembre-o-comeco-da-crise-economica-de-2008-ha-3-anos-banco-lehman-brothers-quebrou-20110915.html - acesso em 25/10/11. Em 2011 nova crise afeta vários países, inclusive alguns cuja economia era considerada sólida (como Irlanda, Itália e França) e em Nova York (EUA) protestos levaram milhares de pessoas a ocupar Wall Street (ver movimento Occupy Wall Street - http://occupywallst.org/) – acesso em 15/10/11

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