O ritmo é de cachorro novo, ágil, sapeca,
imprevisível. Um retrato do Rio de Janeiro sem recorrer a estereótipos, ou
melhor, usando os estereótipos com esperteza, sem a preguiça que costuma
contaminar algumas produções do gênero.
Pedro Amorim (irmão dos também cineastas Vicente e João
Amorim) e o roteirista André Pereira acertam na mão. Doses certas de
romantismo, fofura, deboche, humor. E, felizmente, não recuam diante do
politicamente correto. Mas nem por isso soam grosseiros, agressivos, baixo
nível ou sexistas. Há nudez, mas não apelo ao erotismo (marca registrada de 9
entre 10 produções nacionais), afinal Danilo Gentili pelado não é exatamente “conteúdo erótico”.
Deco (Bruno Gagliasso) é um produtor musical, sem
noção, que vive com fones de ouvido, fora da realidade. Um dos muitos
adolescentes tardios que se recusam a virar gente grande. Carioca, divide o apartamento
com, Leléo, o primo 100% paulista (Danilo Gentili). Deco faz inusitadas mashups, misturas sonoras juntando parceiros improváveis. A trilha sonora do filme
explora de modo eficiente esta característica do personagem.
Um cachorrinho fujão provoca o encontro de Deco e Zoé
(Leandra Leal), após um quase atropelamento. O cãozinho, que sofre de
narcolepsia e desmaia sempre que fica animado, vai formar com o casal uma típica
família feliz. Por dois anos. Cansada dos vacilos de Deco, Zoé, uma radialista
dinâmica e batalhadora, parte para outro relacionamento, com o impagável misto
de atleta-guru-terapeuta zen vivido por Enrique Diaz. Deco fica sem a namorada
e sem Guto, agora um cachorrão.
Usar o recurso do “filme caseiro” para mostrar a passagem
de tempo entre o encontro inicial dos protagonistas – rapaz, moça e cachorro – até
a separação, dois anos depois, funciona muito bem, na duração certa. Contudo, quanto
à duração, o filme poderia enxugar alguns de seus mais de 120 minutos, limando
algumas piadas definitivamente dispensáveis ou encurtando algumas cenas.
Um ponto forte é a multiplicidade de referências. Nada
passa despercebido. Cenografia, trilha sonora, diálogos, e muitas, muitas
referências a filmes, piadas, canções, e até a certa beldade, avessa à
depilação, que já mereceu as páginas de uma revista masculina.
Pode haver certo excesso no elenco recheado de nomes
conhecidos - Elke Maravilha, Marcelo Tas, Rafinha Bastos, Fausto Fawcett, Sidney
Magal – mas não dá pra dizer que se trata de forçar uma barra para encher um
filme vazio. A cantora Sandy entra na história e serve de mote pra discutir
(va lá, nem tanto) a questão do direito de imagem. Acredite, até uma versão de Zé Pequeno
comparece.
Enfim, são inúmeros detalhes (como o Toddynho e o pão
doce colegial), referências, que se encaixam, harmonizam e compõem um filme
gostoso de assistir. Até o merchandising de comida pra cachorro desce sem
arranhar a garganta do espectador. Tenha você cachorro ou não.
Mato Sem Cachorro (2012, 122 min)
Direção: Pedro Amorim
Roteiro: André Pereira
12 anos (conteúdo sexual, linguagem imprópria)
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