terça-feira, 6 de outubro de 2015

NUMA ESCOLA EM CUBA, NOS EUA, NO BRASIL



Dias atrás o canal Telecine Cult me surpreendeu com um documentário: Torre de marfim – a crise universitária americana.  O filme, de 2014, dirigido por Andrew Rossi, conduz uma investigação sobre os altos custos do ensino superior e o endividamento dos alunos nos EUA. Perdi boa parte do filme, mas deu para perceber o quanto lá, como cá, há uma mercantilização do ensino. Uma das questões abordadas era sobre a prioridade dos professores em produzir literatura acadêmica, ganhar prestígio, mais dinheiro, em detrimento de um aprimoramento das aulas, de maior atenção aos alunos. Estes, por sua vez, muitas vezes celebram as poucas horas em salas de aula, a pouca ou nenhuma cobrança por parte dos educadores, um nivelamento por baixo, enfim.


Alguns dias antes, eu havia assistido ao excelente Numa escola em Havana, um daqueles filmes necessários. Duas realidades tão opostas, EUA e Cuba, ensino pago e ensino gratuito, abundância e escassez de recursos materiais.  O filme de Ernesto Daranas tem o grande mérito de não mascarar as mazelas nem demonizar o regime da ilha. O que importa ali é o que deveria importar em qualquer país, em qualquer regime político, em qualquer sociedade. Pessoas. Por trás do menino rebelde, brigão, mau aluno, está uma criança. E sua história familiar, suas carências, incertezas e medos, que ele teme demonstrar e, para isso, os transforma em agressividade. E há a dedicação de uma professora que vê além dos manuais e normas da pesada burocracia cubana, que não se deixa anestesiar pela necessidade de manter a ordem e efetuar punições. Ela sabe que é preciso combinar acolhimento com limites, que deve ensinar, mas também aprender. E, sabiamente, resume tudo ao enumerar o que uma criança precisa: família, escola, disciplina e afeto.


Receita “mágica” que poderia colocar nossa educação num patamar bem melhor do que o 60º lugar no ranking da OCDE. Mesmo que se argumente que os critérios da organização se guiam também por uma visão mercantilizada do ensino, diante de nossos analfabetos funcionais, do parco capital cultural da juventude, do contingente de candidatos a uma faculdade que zeram na redação do Enem, temos que admitir que estamos mesmo mal na fita. A avaliação do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos) também não é animadora.


E as causas vão bem além dos muros da escola, tal como o educar-se vai muito além do instruir-se. Políticas públicas eficientes, de longo prazo, abrangendo as várias instâncias da vida dos indivíduos, como moradia digna, emprego, transporte, acesso a serviços básicos, a um cardápio cultural diversificado, poderiam mudar a rota perigosa em que nos encontramos.


Completando nosso mapa, resgato um texto de Elio Gaspari, publicado em sua coluna no jornal O Globo, sobre as meninas de Santa Leopoldina, trigêmeas filhas de agricultores capixabas. Longe das metrópoles, numa casa sem acesso a internet, Fábia, Fabiele e Fabíola ganharam os primeiros lugares na 10ª Olimpíada de Matemática e deveriam vir ao Rio de Janeiro para receber, no Theatro Municipal, suas medalhas. Como não tinham o dinheiro para a viagem, moradores da localidade instituíram um pedágio para possibilitar a vinda das meninas.


A história das adolescentes de 15 anos é comovente, inspiradora. Seu sucesso passa pelo apoio de professores e da família, inclusive da irmã mais velha, Flavia, a primeira jovem da região a cursar uma faculdade. Hoje, aliás, faz doutorado na Universidade Federal do Espírito Santo. Como bem destaca Gaspari, “As trigêmeas de Santa Leopoldina são um produto da força de vontade de cada uma, do estímulo dos pais, do sistema público de ensino, de políticas bem-sucedidas e de uma professora que estimula seus alunos, Andréia Biasutti.”


Sugiro ler também o texto de Gaspari sobre os larápios de Santa Leopoldina que, diante das trigêmeas, se tornam ainda mais criminosos e desprezíveis. Provavelmente, todos a favor da redução da maioridade penal.

Fontes:


http://www.skilledup.com/articles/ivory-tower-movie-review-higher-education-failing