Na última
terça-feira (08) foi comemorado o Dia
Internacional do Pedestre. Confesso que, pedestre profissional que sou, não
sabia da existência desse dia. Na verdade, não me sensibilizo muito com esse
negócio de “dia disso”, “dia daquilo”, mas, neste caso, achei bem oportuno. Até
porque não implica necessariamente uma corrida louca às lojas para comprar
presentes.
Em nome de uma
suposta modernidade, em muitas cidades espantou-se o pedestre para abrir espaço
para avenidas de alta velocidade ou para estacionamentos. As rodas passaram a
ter mais importância do que as pernas. No Rio de Janeiro, a Barra da Tijuca é
um exemplo dessa visão equivocada de cidade. Pedestres não são bem vindos por
lá.
Por sorte, algumas
luzes surgem no final desse túnel, e não são carros vindo em nossa direção. E
nem aquelas falsas luzes que só servem para iludir o eleitor ou para justificar
obras superfaturadas. Algumas cidades pelo mundo estão priorizando o bípede
humano em detrimento do motor sobre rodas, seja oferecendo transporte público
de graça, ou expandindo ciclovias, ou cobrando taxas para que veículos circulem
por determinados perímetros. Ou redesenhando as cidades para que as pessoas não
tenham que fazer longos deslocamentos para a escola, o lazer ou o trabalho.
O automóvel é ótimo.
Um excelente artefato, como a máquina de lavar, o freezer, o liquidificador, o
aspirador de pó. Uma máquina, como dizem os italianos (macchina) e os russos (машина).
Como tudo na vida, é bom se bem usado. O bem que proporciona não pode ser menor
do que os danos que possa causar. Como a crescente poluição do ar que
respiramos e o aumento da temperatura nas metrópoles, criando as ilhas
de calor.
Jane Jacobs não
era urbanista de formação, ou arquiteta, e sim jornalista. Mas – ou por isso
mesmo - teve a compreensão, décadas atrás, de que uma cidade deve ser
comunicante, espaço de socialização. O arquiteto dinamarquês Jan Gehl também trilha esse caminho e defende
a cidade para pessoas, título de um belo livro seu.
Este tema puxa lá do
fundo de minha memória um magnífico conto do mestre Ray Bradbury (falecido em
2012, aos 91 anos), O
Pedestre (The Pedestrian). Tido como autor de ficção científica, Bradbury
rejeitava esse rótulo. De fato, era isso e muito mais. Escrito nos anos 1950, o
conto é ambientado no ano de 2053, quando o simples ato de caminhar pela cidade
seria uma infração.
O pedestre solitário
de Bradbury pode ser o último exemplar do flâneur descrito por
Walter Benjamin. Uma espécie que já nestas primeiras décadas do século XXI talvez
esteja ameaçada de extinção. Tomara que não.
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