quarta-feira, 26 de novembro de 2008

POLÍTICA DE BATOM


As marcas de batom nos copos descartáveis jogados na lixeira já denunciam: este é um espaço de mulheres. Talvez nos anos 60, 70, não fosse assim, pois vaidade e consciência política não andavam juntas e batom ou brincos não desafiavam o patrulhamento ideológico dos companheiros.

Mas elas estão aqui, do Pará ao Rio Grande do Sul. Algumas, em vez das blusinhas da moda, usam camisetas de campanhas contra a violência sexual ou o racismo. Um traço comum nesse tipo de platéia, salvo uma ou outra exceção, são os cabelos encaracolados, crespos, os penteados afro. Aqui, chapinha não tem vez. Aqui, as mulheres se importam com o que está fora e dentro da cabeça. Lembro-me dos cabelos de Jandira Feghali, alvos constantes de seus adversários.

E por falar em Jandira, Nilcéa Freire, ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, na abertura no encontro, nos lembra que apenas 500 mulheres conseguiram se eleger este ano, em todo o País. Isto representa 9,06% do total de eleitos. E o Estado do Rio de Janeiro é um dos que menos elegem mulheres para as Câmaras. Curiosamente, nos estados do Nordeste, redutos historicamente machistas, a presença das mulheres nas eleições tem sido forte. Este ano, duas disputaram a Prefeitura de Fortaleza e em Natal também foi uma mulher quem levou a melhor. Mas é pouco, diante de um país onde a população feminina passa dos 50%.

José Eustáquio Diniz Alves, sociólogo, economista e demógrafo, Vice-presidente da ABEP, observa que após a 4ª Conferência Mundial Sobre a Mulher, em Pequim, em 1995, houve um aumento da participação das mulheres na política. O Brasil, segundo, ele seguiu esta tendência, mas deu uma estagnada. E mostra uma comparação surpreendente: Ruanda: 58,3% de mulheres no Parlamento, enquanto que no Brasil este percentual é de inacreditáveis 9% (142º lugar no ranking). Para ele, a lei que estipulou cotas para mulheres nos partidos (Lei 9100/95) é equivocada e inconstitucional. Foi reformulada em 1997 e melhorou um pouco, diz ele. Mas, na verdade, a gente conclui que é mais uma daquelas leis que os obrigados a cumprir fingem que o fazem e quem devia fiscalizar, finge que acredita que estão sendo cumpridas. Tereza Cruvinel acredita que até 2010 haverá mudanças na lei eleitoral e vê necessidade de mudar o sistema de financiamento das campanhas.

Por outro lado, o Seminário A Mulher e a Mídia vem crescendo. Nesta sua 5ª edição recebeu 700 pré-inscrições, sendo 270 confirmadas. São mulheres (alguns poucos homens) que lutam em diferentes frentes pela visibilidade da presença feminina na mídia. Em tempos de mulheres-frutas, isso é fundamental. E esta luta busca participação nos centros de poder, uma mídia democrática e não discriminatória, onde a mulher seja autora e assunto. E não precise estar atrelada a um homem para merecer algum destaque e a quem seja conferido o mérito a que tiver direito.

As redações têm muitas mulheres hoje, argumentam algumas, mas, perguntam outras, elas estão em cargos de chefia? Ganham salários iguais aos dos homens? Como em outros tantos campos de discussão, há muitas vezes falsas impressões, brechas no terreno que nos enganam e nos fazem tropeçar durante a caminhada. "É preciso estar atento e forte", já cantava Caetano.

A Ministra Nilcéa anunciou, em primeira mão, o lançamento da campanha/site Homens Pelo Fim da Violência contra as Mulheres (veja na Agenda deste blog). Foi meu primeiro encontro com A Mulher e a Mídia; ficarei de olho na 6ª edição.

A cobertura completa do Seminário você encontra no site: http://www.patriciagalvao.org.br/novo2/index.htm

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

OLHOS ABERTOS PARA A CULTURA




Aracy de Almeida deve estar sorrindo, com aquele seu jeito moleque, desaforado mesmo. E pensando como a vida pode dar lições curiosas. A Zona Norte do Rio, berço da preferida de Noel Rosa, da Dama do Encantado (como a cantora era conhecida), é uma região carente de opções culturais. Todo mundo sabe disso, inclusive os gestores públicos, aqueles que decidem para onde vão as verbas alimentadas com os tributos que o povo – de todas as regiões da cidade – paga. Mas eles parecem não enxergar esta realidade.

Por isso é especialmente notável que um espaço cultural na Zona Norte seja inaugurado numa instituição de apoio a deficientes visuais. Pois foi no teatro da União dos Cegos do Brasil (UCB), no bairro do Encantado, que o Centro Popular de Cultura Aracy de Almeida, com a parceria da Arte Nova Produções e o apoio da CTIS Informática, encontrou condições para materializar a homenagem à cantora, morta em 1988.

você lê a matéria na íntegra no http://www.terceirosetor.jor.br/edicoes/ed11/0809capa.asp

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

CINE GAIA – MEIO AMBIENTE NO CINEMA (parte 1)




O I Festival de Cinema Ambiental do Jardim Botânico do Rio de Janeiro se encerrou no último domingo. Foram dez dias de exibições gratuitas no JB – num belo teatro onde paredes de vidro nos deixam ver um pouco do verde lá fora – e no Centro Cultural dos Correios. Assisti a menos filmes do que gostaria, mas dos que vi guardei boas lições e lembranças. Na recepção, gente simpática e atenciosa. Até me pediram um depoimento que, apesar de mais acostumada a escrever do que a falar para câmeras, concordei em dar, no desejo de colaborar com um evento tão bem-vindo. A divulgação, ao que parece, é que não foi eficiente o bastante, pois o público era reduzido. Uma pena! Mas este foi só o primeiro. Que venham o II, o III e muitos mais. E que as salas de exibição se multipliquem pela cidade e estejam cheias de gente de todas as tribos.

CENA 1 – Noilton Nunes e Pedro Sol aproveitaram o kuarup de Orlando Villas Boas, em 2003, para abordar várias questões ligadas aos povos indígenas. Seu filme mostra a atuação de líderes como o pajé Sapain e os caciques Aritana e Raoni na luta pela preservação do parque do Xingu. KUKA HITCHUTI é o nome de seu filme, palavras que significam algo como: você já abriu os olhos? Com esta pergunta as crianças acordavam a equipe que permaneceu na aldeia durante as filmagens. Os realizadores transferem para a platéia a pergunta, para que não percamos de vista as ameaças que o avanço do cultivo da soja e da pecuária, atividades incentivadas ou toleradas por autoridades, representa não apenas para os povos do Xingu, mas para todo o planeta.

CENA 2 - As vítimas do acidente com o Césio-137 de Goiânia ganharam voz no documentário O PESADELO É AZUL (uma alusão à luminosidade azulada emitida pelo material radioativo), de Ângelo Lima. Contam como perderam tudo, a falta de informação, o tratamento inadequado que tiveram por parte das autoridades. Foram discriminados pela população, vítimas da ignorância. Sofrimento físico e moral que perdura até hoje, 21 anos depois que catadores de lixo encontraram a cápsula com o Césio, abandonada numa clínica de radiologia desativada pelos donos e esquecida por quem deveria fiscalizar, e a violaram, na intenção de vender o metal para um ferro-velho. No material de arquivo, Fernando Gabeira aparece denunciando que a população deveria ser bem informada sobre o que ocorria para poder lutar junto naquele que foi o maior acidente radioativo do mundo (mais grave que Chernobyl). E perguntava: “Como colocar uma casa no lixo?”, referindo-se à contaminação que atingiu pessoas, casas, animais, meio ambiente. A Fundação Leide das Neves (menina de 6 anos, morta pelo Césio) criada para dar apoio às vítimas, não atende a todos, denunciam os moradores de Goiânia.

CENA 3 – ITATIAIA: VISTO POR DENTRO – Aqui o azul não é mortal, é uma das muitas cores que invadem a tela numa poesia visual, como definem os realizadores Christian Spencer e Gibby Zobel. Os nomes são estrangeiros, mas a produção é nacional e leva o espectador a um passeio de 23 minutos pelas belezas da Mata Atlântica, acompanhado por uma trilha sonora composta pelo homem e pela Natureza. As estrelas deste espetáculo são aves de colorido inacreditável, o Muriqui (maior primata das Américas) e a jaguatirica, que desfila silenciosamente pelas veredas da floresta. Um show!

CINE GAIA – MEIO AMBIENTE NO CINEMA (parte 2)


CENA 4 – A GENTE LUTA MAS COME FRUTA – sem trocadilho, é um filme para se saborear. Faz parte do projeto Vídeo nas Aldeias e traz lições de convivência entre homens de diferentes etnias, diferentes tribos e entre eles e a natureza. Issac Piyãko, um dos diretores do filme (ao lado de Valdete Piyãko) estava presente nos Correios e sua fala segura, mas mansa, objetiva e coerente nos faz perguntar: não devia este homem estar nas tais reuniões do G-8 ou do G-20? Os indígenas da tribo Ashaninka revelam grande sabedoria ao lidar com os recursos naturais. Plantam árvores frutíferas próximas à aldeia, cuidam da reprodução dos tracajás (quelônios aquáticos), da repovoação dos rios. E na luta contra madeireiros e caçadores mostram determinação, mas consciência de que o diálogo deve ser a arma prioritária no entendimento humano. Assistir ao filme, ver e ouvir Issac com suas belas vestes, nos mostra concretamente o que é desenvolvimento sustentável, como é possível usar tecnologia a favor de todos. Dá uma vontade danada de partir para o Acre, ver de perto os frutos do trabalho daquele povo, provar daquelas frutas.

CENA 5 – O documentário de Sérgio Bloch, MINI CINE TUPY, é um alento para quem vê a cada dia os cinemas fecharem (como o lendário Paissandu, no Flamengo) ou se transformarem num espaço onde pessoas ingerem ruidosamente baldes de pipoca e refrigerante, falam ao celular, enquanto assistem a um filme. José Zagati, catador de papelão da periferia de São Paulo, encantou-se pelo cinema ainda criança. Num país imenso que tem apenas 1982 salas (dados da Ancine para 2004), aquele cinema de sua infância já não existe mais. Com materiais encontrados no lixo, Zagati montou o Mini Cine Tupy na garagem de sua casa e nas noites de domingo abre as portas, posiciona o projetor e leva as crianças a uma viagem mágica. Na sua simplicidade e sabedoria, observando a ligação dos inventos do Homem com a Natureza, José Zagati conclui que “Deus deve ser cineasta”.

CENA 6 – BARTÔ – Um dos poucos filmes para os pequeninos. A animação de Luiz BoTosso e Thiago Veiga traz um simpático bode que se vê ameaçado de perder a única sombra onde pode se abrigar do calor escaldante. Um lenhador tenta cortar a árvore sob a qual ele pretende tirar uma soneca, mas ela não se entrega facilmente. Para derrotar todos os recursos a que o homem recorre – machado, explosivos, motosserra – a árvore conta com sua agilidade e a ajuda das forças da natureza e, claro, do bode Bartô. Um jeito divertido e eficiente de falar de preservação ambiental.

CENA 7 – Da Noruega veio CAMPOS DE DEMÉTER. O documentário mostra como o cultivo de alimentos mudou a face do solo europeu e como precisa ser harmoniosa a convivência entre a ação do homem e vegetação natural. Reporta-se à lenda de Deméter, deusa da agricultura, cuja filha foi raptada por Hades e levada para o interior da Terra. A mãe consegue que a filha seja libertada durante seis meses do ano, quando então a natureza floresce. Nos outros meses, há frio e escassez de alimentos, daí a necessidade do homem aprender a cultivar para não sucumbir à fome.

EXPEDIÇÕES URBANAS - ARTE POR TODOS OS LADOS


Você já foi ao Centro Cultural da Justiça Eleitoral? Não? Então vá! Veja que não estou falando do Centro Cultural da Justiça Federal, também uma beleza, ali na Rio Branco. Há tempos eu namorava o vetusto prédio da Rua Primeiro de Março 42, nas minhas idas e vindas do Centro Cultural Banco do Brasil (outra belezura arquitetônica). E foi assim no último domingo, indo ao CCBB e ao Centro Cultural dos Correios (mais uma jóia), com minha filha querida, entrei enfim naquele monumento. Ainda havia tapumes na entrada, mas lá dentro, obras só as de arte. A exposição em cartaz é Arquivo Geral, mas, cá entre nós, meus olhos se encantaram mais pelas colunas, paredes, tetos. Um deslumbramento.

Não cheguei a visitar o andar superior, pois a fome nos obrigava a ir à caça de um lugar para almoçar. Mas até que me agrada a idéia de que há ainda naquele prédio centenário recantos a serem explorados. Nas obras expostas, arte contemporânea, diversas maneiras de olhar o mundo que nos cerca. Diz o folder da exposição: "É um evento síntese do mercado de arte carioca concebido para potencializar a agitação cultural gerada periodicamente pela Bienal de São Paulo nacional e internacionalmente". Há minúsculos esqueletos de pássaros (ou não?) e uma adorável colagem de bibelôs, daqueles coloridos e salpicados de dourado que a gente comum chamaria de bregas, mas os artistas e descolados, creio eu, chamariam de kitsch.

Uma escultura atrai nosso olhar, do jeito que a arte deve chamar a atenção: tocando algo lá no fundo da gente, uma emoção, um tremor, um arrepio. Apesar de sua matéria prima ser galhos retorcidos não atentei logo para o óbvio. Mas ao conferir a placa lá estava: Frans Krajcberg. Mestre é sempre mestre. E não pelo status ou fama, mas pelo divino dom.

Vá ao CCJE, para ver as exposições e, sobretudo para conhecer uma preciosidade que temos em nossa cidade. Aproveitemos o que ainda nos resta, construções que guardam nossa História e conseguiram escapar da irresponsabilidade dos governantes, da ignorância predatória, das garras da especulação imobiliária. São lugares que, quando em viagem, especialmente no exterior, fazemos questão de conhecer e aos quais, quando em terras tupiniquins, nem sempre damos o merecido valor.
http://www.tse.gov.br/servicos_online/centrocultural/index.htm">