sexta-feira, 3 de agosto de 2018

CRÔNICAS RUSSAS – MOSCOU (3) – Tour, Igreja do Cristo Salvador e uma expedição solo por Москва

Teatro/Ballet Bolshoi




 A bordo do nosso fiel ônibus de turismo, fui clicando algumas das muitas faces desta cidade fascinante, com seus quase mil anos de história. Considera-se o ano de 1147 como de sua fundação, atribuída ao Príncipe Yury Dolgoruky. De seu coração, na Praça Vermelha/Kremlin, partem avenidas que em geral se cruzam com vias circulares, os chamados “anéis”. O primeiro é o “Anel dos Boulevards” e circunda o centro histórico. Há também o “Anel dos Jardins”, que corresponde a uma área anteriormente utilizada para agricultura. Os indícios da Copa do Mundo são poucos (a não ser pelas muitas obras) e a mascote Zabivaka ainda não passeia pelas ruas.




Estátua do Príncipe Yuri, fundador de Moscou




Referência aos 870 anos de Moscou, celebrados em 2017




Casa no estilo antigo/tradicional russo, com janelas decoradas



Em 2017 Moscou celebrou 870 anos
 
Prédio de 1897 que abrigou a KGB (КГБ). Hoje é sede do Ministério de Segurança Nacional - Praça Lubianka (Лубянка) . 

 Moscou tem 400 igrejas ortodoxas, mas há também mesquitas, sinagogas e igrejas católicas. Segundo nosso guia, as religiões convivem sem conflitos. A Catedral Cristo Salvador (Храм Христa Спасителя) é do final do século XIX e foi erguida para celebrar a vitória sobre Napoleão. Nos anos 1930, Stalin mandou destruí-la e em seu lugar foi construída uma piscina pública. Após a queda do regime soviético, o Patriarcado de Moscou (autoridade religiosa ortodoxa) liderou uma campanha para que a catedral fosse reconstruída. Inaugurada em 2000 pelo Presidente Vladimir Putin, a edificação que vemos hoje é uma cópia fiel da original (Benjamin e Martín-Barbero querendo aqui entrar na conversa. Nota no final da crônica)1.













A capital russa tem outros casos de “faz-desfaz-refaz”. O Hotel Moscou, da época stalinista, por exemplo, foi demolido e um prédio idêntico construído em seu lugar. A intenção era modernizá-lo, porém os cômodos eram pequenos, daí, pôs-se tudo abaixo e hoje é um hotel de luxo de uma rede famosa. (Aqui no Brasil convivemos não raramente com um faz-desfaz, faz-abandona, começa a fazer e não acaba...  História vira pó, dinheiro público desaparece...).

Fomos depois a uma loja de souvenirs - como as guias portuguesas já haviam nos avisado - bem menos interessante do que a que visitamos em Petersburgo. E mais cara. Em meio à invasão chinesa de praxe, consegui comprar mais algumas lembranças e presentinhos, mas novamente a tentativa de levar para casa uma camisa do futebol nativo fracassou. O máximo que consegui foi um boné Fifa Russia 2018. Creio que os russos ainda não haviam descoberto a dor e a delícia de torcer por um time de futebol. Com a atuação surpreendente da Seleção Russa (Сборная России по футболу) no Mundial, não duvido que agora andem atrás de camisas de Igor Akinfeev (Игорь Акинфеев), Mário Fernandes (Марио Фернандес) e dos outros garotos comandados pelo treinador Stanislav Cherchesov (Станислав Черчесов). 

Time escalado para o jogo contra a Espanha - Seleção Russa de Futebol (foto do Facebook)
 Ao final deste segundo e intenso dia em Moscou, tive de tomar uma decisão não muito fácil: me arriscar ou não a voltar à Praça Vermelha (sempre ela!) sozinha, seguindo as orientações dos guias (de turismo, rezando para que os espirituais também estivessem atentos). Bem, é agora ou sabe Deus quando. Vamos lá, encarar a monumental Rua Tverskaya (Тверская улица), tomar o café da tarde e comprar o lanche da noite. Coragem, criatura! 
Estação de metrô na Tverskaya





Na vitrine de uma livraria
Izvestia (Известия) é um jornal de alta circulação. Pode ser traduzido como "notícia".


Homenagem a Constantin Stanislavski e  Niemiróvitch-Dântchenco


Aproveitei para dar uma espiada na Praça Pushkin (Пу́шкин), que eu havia visto só do ônibus. Ela é a queridinha dos namoradas e é comum ver flores ao pé da estátua do poeta. Em frente, fica o Café Pushkin, muito concorrido, que não tive tempo de conhecer.

O poeta Alexander Pushkin (Алекса́ндр Серге́евич Пу́шкин)

A Praça Bonita/Vermelha fica a cerca de meia hora a pé do hotel. Fui caminhando sem muita pressa, embora já estivesse anoitecendo, tentando gravar na memória, e não só nas fotos, aquela avenida, os prédios, monumentos... Já estando próxima da Praça Vermelha, me vi num ponto da avenida onde não há travessia para pedestre. E o trânsito é intenso. Desconfiei que seria pelo subsolo, pela estação do metrô. Desci as escadas e parei... me pareceu um labirinto. De volta à calçada, uma moça fotografando me fez imaginar que seria uma turista, quem sabe falante de inglês. Não era, mas com alguma mímica, duas ou três palavras em russo e um pouco de inglês, consegui explicar que queria atravessar. Por sorte ela também. Muito solícita, me guiou e cheguei vitoriosa ao outro lado, confiante que ia conseguir achar o caminho de volta.

Já dentro da Praça, o pôr do sol por trás da São Basílio criava um cenário de uma beleza... (suspiro!) Difícil descrever. Fiz mais uns cliques e voltei ao GUM para tomar café e garantir um petisco a fim de não passar fome à noite. Achei o Coffee Mania (Кофемания), que tem várias lojas em Moscou, pelo que vi depois no site deles. Ótima escolha: os atendentes falam inglês e são super gentis. Paguei 1.213 rublos e, como cliente da casa, ganhei um cartão para acesso ao WC, que no shopping é pago (30 rublos).






 
 Quando saí do GUM já estava escuro. Voltei ao Hotel orgulhosa de minha “aventura” pelas ruas daquela cidade, sempre associada ao mistério, aos filmes de espiões, aos revolucionários comunistas, aos desfiles militares, ao inverno rigoroso. Despertando cada vez mais minha curiosidade por sua história, sua gente, sua cultura, suas lendas, crenças, aspirações. 



Vista do mausoléu de Lenin a partir da entrada do GUM
  
(1) É famoso o texto de Walter Benjamin, A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica, sobre a possibilidade de multiplicação de obras de arte graças à tecnologia. O autor não se referia exatamente a catedrais, mas me veio à memória já que falamos aqui de original e cópia. Martín-Barbero crê que há uma distorção na interpretação do texto de Benjamin, afirmando que “reduzido a umas tantas afirmações sobre a relação entre arte e tecnologia, tem sido convertido falsamente em um canto ao progresso tecnológico no âmbito da comunicação ou tem-se transformado sua concepção da morte da aura na da morte da arte.” (Dos meios às mediações. Ed. UFRJ, 2009, p.81). Eu penso que a cópia democratiza o acesso à arte, mas, nem a morte da aura é a morte da arte nem as reproduções invalidam a magia da aura, que só o original pode conter. Não fosse assim, por que iríamos aos museus?


 

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