domingo, 5 de abril de 2015

UM CONTO SENEGALÊS



Não faz muito tempo assisti no Globo Rural uma matéria sobre a exportação de gado bovino para a África. Não, não se trata de exportar carne bovina. São vacas vivas, em pé, como se diz. Cada vaca, da raça Guzerá, é comercializada ao preço de 5 mil reais. No caso mostrado no programa da TV Globo, as senhoras ruminantes partiam de Natal-RN rumo ao Senegal, país da costa ocidental africana. Seu nobre destino: serem doadas a famílias pobres para produção de leite.



Imediatamente me lembrei do curta “Si J’avai une vache” que assisti na Mostra de Cinema Ambiental FICA 2014. Trata-se de um pequeno grande filme. Pequeno porque é um curta, porque não tem grandes pretensões autorais, estéticas. Grande porque volta suas lentes (e atrás delas, a emoção de quem filma e edita) para uma história simples, mas carregada de significados. E a filma com delicadeza e competência. Uma história que nos enche o coração de um sentimento reconfortante, cada vez mais raro de se sentir e que pode ter vários nomes: alegria, esperança, empatia, fé...



O curta de Norma Nebot é singelo, quase infantil, por isso guarda uma verdade própria das crianças, aquelas a quem ainda é permitido ser criança. O filme se apresenta como “uma história de amizade” e acompanha a rotina de uma comunidade, em Burkina Faso, onde “quem tem uma vaca é rico”. É tocante ver como compartilham o cuidado daquele animal, fundamental para sua alimentação. Como entendem a importância de cada um na manutenção daquela fonte de vida.



Acostumados que estamos a ver, ainda que nos reis do gado da TV ou nos jornais e revistas, a boiada gorda que ocupa grande parte de nosso território, nos surpreendemos com o valor que aquelas vaquinhas magras têm para o povo daquele país. E como eles, longe de disputarem propriedade e poder, se unem para ter os benefícios que uma vaquinha de leite pode dar a uma comunidade pobre. Para aquela gente, uma vaca que dê leite é uma preciosidade, cuidada com todo carinho.



Já falaram das muitas coisas expostas nas vitrines sedutoras dos shopping centers das quais não precisamos para sermos felizes(1). E as vitrines seguem cada vez mais sedutoras e variadas e as pessoas não necessariamente mais felizes.



Mas eu fiquei muito feliz em saber que vaquinhas brazucas estão cruzando o Atlântico para servir a irmãos africanos. Viajando de avião, estas vaquinhas me lembram o delicioso filme hermano “Um conto chinês” (2), uma história que liga China e Argentina e onde duas vacas, cada uma a seu turno, são protagonistas de tragédia e de redenção. Que estas vaquinhas, que aproximam Brasil e Senegal, só protagonizem alegria e prosperidade. Bon voyage, madames.



Assista aqui ao trailer deste filme delicadeza:





(1)Texto de Frei Betto:







Nesta matéria você fica sabendo mais sobre a aventura oceânica das vaquinhas potiguares : http://tribunadonorte.com.br/noticia/criadores-do-rn-exportam-gado-guzera-para-o-senegal/302600