quinta-feira, 14 de junho de 2012

Sala Escura: DEUS DA CARNIFICINA


 A premiada peça de Yasmina Reza vai para as telas sem perder seu vigor. O velho Polansky faz cinema e passa longe do teatro filmado. E teve o bom senso de não esticar seu filme, que dura menos de uma hora e meia.

A briga de dois garotos deflagra uma guerra entre dois casais, guerra que começa fria e com diálogos calculados e vai tomando outros rumos. A discussão do quarteto oscila entre a polidez convencional, a agressão e o ridículo. E recomeçam e recomeçam, numa ciranda onde cada um quer justificar a si mesmo, apontando as fraquezas – ou hipocrisias – do outro. Soa um tanto familiar, não?

Durante o palavrório, a temperatura sobe e desce, Lembrar seus heróis de infância, por exemplo,  é para os homens um momento de descontração. A guerra verbal vai expondo problemas camuflados, muito além daquele que originalmente os reuniu. Interferências externas vêm pôr mais lenha na fogueira e trazer mais munição para os ataques entre os casais, entre os homens, entre as mulheres, entre eles e elas. Conforme a conveniência, o inimigo pode se tornar o aliado.

Alfinetadas, ou melhor, agudas estocadas na indústria farmacêutica fazem o drama/comédia ultrapassar as fronteiras da vida privada para as questões sociais. A dependência tecnológica também diz presente (a vida do pai está no celular e a falta deste aparelhinho é a única coisa que pode fazê-lo, literalmente, desabar). O “politicamente correto” também não é poupado da acidez do texto. Ácido, mas cheio daquele humor meio torto, que incomoda, mas faz rir.

Bom ver duas atrizes – Jodie Foster e Kate Winslet – amadurecendo, com a beleza de seu tempo e apurando seu talento, levando com total competência seus papéis. E os rapazes - Christoph Waltz e John C. Reilly - estão à altura das jovens senhoras.

Polanski vive há décadas na Europa, já que não pode voltar aos EUA, onde foi condenado por ter mantido relações sexuais com uma garota de 13 anos. O diretor polonês deve ter tido um gosto especial em fazer este filme, um retrato da sociedade ocidental, seus vícios, suas fraquezas, pintado com palavras que são como flechas pontiagudas, embebidas em generosas doses de Scotch.

DEUS DA CARNIFICINA (God of carnage)
Direção: Roman Polanski
Alemanha/França/Polônia, 2011, 80 min


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