domingo, 12 de fevereiro de 2012

Sala Escura: A GUERRA DO FOGO

Vi este filme pela primeira vez no começo dos anos 1980. Algumas cenas jamais se apagaram da minha memória. Tenho agora a oportunidade de revê-lo e o impacto que sinto hoje não é menor, ao contrário, é talvez maior do que aquele que senti algumas décadas atrás, apesar da exibição em DVD, em casa, e não numa sala de cinema.

Creio que todos nós – mesmo os adeptos da teoria do Criacionismo – devemos rever este filme periodicamente. Revê-lo para nos lembrarmos de nossa condição humana e de nossa condição animal, de nossa grandeza e de nossa fragilidade.

Num mundo onde tudo é ainda desconhecido, vemos diferentes estágios da evolução da espécie, com homens de aparência mais próxima à de macacos e outros semelhantes ao que somos hoje. A tribo mais evoluída, ou seja, aquela capaz de produzir o fogo, é também a mais pacífica. Poderíamos argumentar que isso acontece porque não precisam guerrear pela posse do fogo, mas há algo mais naquele povo, de corpos pintados, de compleição mais delicada, que já dominam algumas técnicas para confecção de utensílios. Eles acolhem o estrangeiro e, ainda que o aprisionem e se divirtam com ele, lhe oferecem comida e mulheres. Primórdios da diversidade racial. Aliás, o elenco reune atores das mais variadas origens étnicas.

Eles se divertem com o prisioneiro. Na verdade, o riso é outra característica daquele povo, que poderíamos identificar como o mais humano entre todas aquelas tribos. E nós, humanos do século XXI, pensamos como à guerra do fogo, sucedem-se outras infinitas guerras: por terras, por petróleo, por água, e tantas outras guerras cotidianas, alimentadas pela cobiça, pela inveja, pelo desrespeito, pela intolerância.

Claro que à pesquisa científica considerada na produção do filme soma-se a liberdade dramatúrgica, a poesia, a mensagem que os autores, intencionalmente ou não, colocam em seu trabalho. Mas não é difícil crer que, naquelas trajetórias, cheias de medo e assombro, de encanto e luta pela sobrevivência, os homens primitivos foram descobrindo o sexo com afeto (e, por isso, mais prazeroso), o abraço, o toque, o riso. E foram também descobrindo os sons de sua própria voz, as palavras, a linguagem falada, traço diferencial da espécie.

Cientistas talvez tenham questionado o filme (não sei), mas acredito que muitos de nós sintamos que aquele homem primitivo ainda está dentro de nós. E que precisamos resgatar nossa conexão com ele. Num tempo em que nos conectamos mais com objetos do que com pessoas e que os próprios corpos se transformam em objetos, carne para consumo, é bom pensar nessa conexão perdida, com a natureza, com os animais. Como na cena em que nosso heroi Naoh olha dentro do olho do mamute e, em vez de agredi-lo, lhe oferece alimento.


A guerra do fogo (La guerre du feu / Quest for fire)

Direção: Jean-Jacques Annaud

Roteiro: Gérard Brach, sobre romance de J.H.Rosny Sr.

Canadá/França/EUA, 1981

http://www.imdb.com/title/tt0082484/?licb=0.886969049819912

Eles se divertem com o prisioneiro. Na verdade, o riso é outra característica daquele povo, que poderíamos identificar como o mais humano entre todas aquelas tribos. E nós, humanos do século XXI,